Mulher - 1973

Antonello L'abbate

Água-forte e Água-tinta
Cobre 30 x 39 cm

Contos Contados em Cartas Cinzentas

Parte III - Um Conto de Natal

Eram seis horas da manhã, não havia dormido bem. Meu corpo estava dolorido e minha garganta completamente seca. Os raios de sol ultrapassam pelas frestas da janela, o que gosto muito de observar e...neva lá fora. A poeira paira na luz plumando levemente.

- Natal novamente. Havia esquecido! - Observo o teto

Pensei em ficar por mais tempo na cama. Estava exaurido de uma lastimável tristeza, e no meu quarto me sinto por poucas vezes desconectado dos pensamentos vis humanos. É um cubículo aconchegante, com cheiro de bolor impregnado em suas paredes, e a cor cinzenta que aderiu com o tempo onde, para mim, é o reflexo de minhas emoções. Há poucos objetos, nada de interessante aos olhos de um visitante, e os visitantes são minhas memórias.

- Tudo era tão compartilhado. Hoje cito como meu! - Penso

Havia meu guarda-roupa, nada em especial diria. Depositei minhas lembranças em uma de suas gavetas. Já se passaram três anos em que minhas lembranças não são remexidas, estão envelhecidas de uma mordaz e infrutífera paixão. Foi o único lugar após mudanças, de objetos descartados, que não houve nem sequer um vislumbre. Empenhava-me diariamente apenas em mente sobre o ato.
Eis que, nesta manhã, observo do meu divã a gaveta.

- Memórias - Penso por muito

Sintomas sobrecarregam meu corpo de medo, desespero...falta-me ar. Corro com uma idéia súbita. Estou com as mãos na gaveta. Refleti. Abria-a. Estou com olhos os fechados e com os sintomas anteriores...soluço.

Fui até a cozinha palpitando as paredes, e me detive de fronte ao crematório. Olhei por muito, sorri.

- Tudo fenece - Murmuro

Volto para cama desolado. Mas, com o pesar agradável de um ser que, "Estimou tudo ao seu alcance". E na noite de Natal. Adormeci.

Nota: O conto acima, foi o que abriu as páginas do Fanzine Noites Brancas Capítulo I . O título é o original. Situa-se noutro tempo, claro. O do fanzine, passa-se numa primavera de ontem e numa primavera que o personagem não viu flores.

Traum Bendict

CAPA - FANZINE NOITES BRANCAS



" Ao amor reconfortante e passageiro...
Ao silêncio brando mortífero"

Traum Bendict

Sobre Sinos e Neve

Parte II - Um Conto de Natal

A neve cai, estou debruçado na janela. É noite, as luzes da cidade, seus prédios com seus piscas me deixam em transe. Terei que ficar novamente silencioso,sem respirar,se me mover? Crianças correm com um velho, sorrindo. Ele parece no seu íntimo muito triste. Olha para mim, lhe dou um balanço de mãos.

Fecho a janela, escuto vozes na sala, terei que correr para não ser visto. Não importa, sou invisível. Coloco meu saco de pano na cabeça e vou ao sótão.

Chegaram. Ouço a felicidade momentânea. Estou com as mãos na parede e a cabeça para baixo, estou enjoado, tonto, minha cabeça tine com sinos gigantes dentro do meu ouvido. É o câncer, me deformou e este será meu último natal. Nunca tive um natal, não ligo para bobagens. Seria bom ter um natal. Ouço sorrisos, os sinos param de tocar. Aleluia. Mataria agora mesmo um padre.

No pano que mantenho em minha cabeça, está a resposta, a ira, o desprezo, o refúgio, a salvação, o paraíso...Eles se divertem com suas músicas alegres, tapo os ouvidos, o som do amor.
É hora de descer, são 23:45, irei dizer: " Surpresa", e o câncer escorrerá em suas caras. Não, tenho que esperar, seus costumes se repetem todos os anos, previsto.

Ando lentamente até o quarto. Já está bêbado. Ascendo o abaju, estou ao seu lado, imperceptível. Pego o travesseiro pausadamente, o sangue escorre pelo meu nariz manchando em uma forma horripilante meu capuz.

- Olá - Suspiro em seu ouvido.

Ele se assusta e acorda. Tapo sua respiração, ele se debate.

- Você não irá comigo. Não é a mesma coisa. Não irei quebrar a parede. Você não irá comigo. Ahhhh! - Imóvel. Retiro o travesseiro, sua boca aberta com seus dentes amarelados sorriem para mim. Ouço uma badalada.

Tenho pouco tempo. Lhe observo pelo buraco na parede. A lâmina brilha em minha mão. Abro a porta, caminho e me observo no espelho. Me aproximo. sinto o vapor da água que desce do seu corpo, sua costa branca me corrompe. Nunca vi algo assim.

- Não sou minha mãe - Digo.

Ela se vira e lhe enfio minha foice várias vezes. O vapor se mistura com o odor pesado carmesim. Ela se encosta na parede e num estranho movimento, desliga o choveiro. Ouço uma badalada, agora mais distante.

Desligo a luz do sótão. Estou cansado, fraco, sangro. O último sino virá até mim.
Os passos na escada rangem. A luz se ascende, tudo está turvo.

- O que você fez meu querido? - Uma voz doce.

Ligo o fonógrafo com uma música clássica, uma ópera que ela cantara numa catedral, em uma bela primavera. " Meu querido", novamente ela diz. Com as mão no peito, seu coração se machuca com aquela música, ela se contorce e seu coração pára de soar.

- Ohhh! Véronique, também tenho uma vida dupla. Você não está apenas aqui.

A casa está vazia. Ouço o último badalar quase que, como um côro de anjos reunidos em um salão de ecos.
A neve cai, caminho até a frente da casa. O frio me paralisa e as luzes, os piscas, me deixam em transe. Já é natal. E me recordo de ter tido o mesmo sentimento...debruçado na janela.

Teoria da Solução

" Deixaria de ser se perdesse minhas estrelas, disse certa vez alguém que se feriu gravemente com o espinho de uma rosa. Deveria ser impossível imaginar a sensação de aniquilamento mas, ao pensar em um tal céu sem estrelas, esta é a primeira palavra a surgir em minha mente. A visão da imensidão, nua, sem véus ou adornos, deve ser insuportável para qualquer ser humano. A falta de pontos que nos mantem, faria com que fôssemos engolidos pela escuridão. Uma estranha idéia, mas esta presença pareceria ser um espelho infinito a refletir o mundo ao nosso redor, e a nós mesmos.
Será verdade, as estrelas morrem, ou isto será apenas o reflexo de algo que suprimos do nosso mundo?
A certeza de tal acontecimento ser real é apenas mais uma das pretensões humanas. Como poderiamos saber se todas elas já não se foram? Confiamos apenas em nossos limitados sentidos para tirar tal conclusão.
Hoje podem todas elas já terem morrido, o véu que encobre-as pode ser sua mortalha, mas quem garantirá que quando o retirarmos, elas ainda estarão lá?
Certa vez, as vi cairem do céu, uma imensa chuva. Uma placa em meio a uma avenida, onde estava escrito " CUIDADO ESTRELAS CAINDO" foi tudo que fizeram.

Rosangela

Texo retirado do Fanzine Noites Brancas Cap.I, página III. Título original.

Este belo texto que foi me dado em uma folha de papel quase amassada, com mais alguns rascunhos. Foi uma colaboração da Rô, que sem a sua ajuda o fanzine nunca teria sido escrito.

Obrigado!








Prelúdio de Um Conto de Natal

Chego em casa e encontro a casa desordenada numa noite de natal. Não encontro meus filhos, fiquei atordoado. Os presentes caem de minhas mãos, todos os pensamentos surreais passam por minha cabeça. Estava separado há três anos e estava sendo perseguido por minha ex-mulher. Ela já havia prometido queimar a casa e até se enforcar na sala de entrada. Imagino que ela havia sequestrado meus filhos, e impulsivamente os procuro pela casa em meio os objetos jogados ao chão e garrafas de vodca com copos coloridos. Copos que dei no natal passado ao meus filhos e que eles usavam para tomar sua vitamina diária de excremento de pardais. Remédio aconselhado por Dr. Bird.
Após revirar a casa percebo dois bonecos de neve no canto do quarto. Segui lentamente, e queria hoje, que aquela caminhada durasse eternamente. Reconhecia seus olhos, comecei a tirar a neve...fiquei de joelhos e em lágrimas, os abracei. Sentia ainda o cheiro dos seus cabelos, a macia pele dos meus gêmeos albinos, gélidas, sem vida e com odor de alcóol...Eles tinham 12 anos e nunca haviam se embriagado. Enquanto a mim, dei os últimos goles de uma das garrafas e peguei um pedaço de gelo da boca de um dos meus queridos filhos. E ainda hoje penso: "Não há nada pior, do que ter uma mulher como inimigo".

Noites Brancas

Após uma ausência, irei retomar meus esboços nestas páginas.
Para os que não tiveram oportunidade de ler o Fanzine Noites Brancas físico. Estarei colocando trechos do primeiro capítulo. O capítulo II está em preparação e infelizmente alguns só poderão ler atráves deste humilde blog com um pouco de atraso, pois a prioridade é o impresso.
Sem delongas, irei retratar minha experiência na direção do meu primeiro curta, O SUBSOLO. Que após totalmente finalizado, pretendo-o colocar no blog com o título ALGUNS DELIRIUM.
No mais... se inicia com esta postagem um esboço para o início.